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Com Bolsa Família bloqueado e sem saber ler, mãe de cinco recorre às ruas para pedir comida: 'escolher morrer do coronavírus ou de fome'

3.5.20

/ por casinhas agreste
Rosângela Pereira da Silva tem 31 anos e, há dois meses, não recebe os R$ 380 que sustentam a casa. Ela mora na comunidade do Coque, no Centro do Recife, e agora depende da solidariedade de estranhos para sobreviver.
Por Pedro Alves, G1 PE
'Escolher morrer de fome ou de coronavírus', diz mãe de 5 que teve Bolsa Família cortado
"Eu tive que ir para o Centro da cidade, esperando esse povo que para, em um carro, distribuindo refeições. Agora, me diga, como é que o governo nos diz para ficar em casa, se nossa dispensa está vazia? Daqui a pouco vamos ter que escolher morrer do coronavírus ou morrer de fome".
O depoimento é de Rosângela Pereira da Silva, 31 anos de idade. Mãe adolescente, solteira, ela teve o primeiro filho, hoje com 17 anos, aos 14. Os outros quatro têm 14, 11, 10 e 2 anos. Desempregada, ela sustentava a casa e os filhos com os R$ 380 recebidos do Bolsa Família, que, inesperadamente, foi cancelado.

Sem ter o que comer, ela não teve outra opção a não ser quebrar o isolamento social para pedir, nas ruas do Centro do Recife, alguma refeição.

A pandemia do novo coronavírus deixou ainda mais vulneráveis as 1.125.559 famílias que, em Pernambuco, sobrevivem do auxílio do governo federal. No caso de Rosângela, que mora no Coque, que também fica no Centro da capital, os efeitos foram imediatos, já que, sem a única fonte de renda que tem, ela só não passou fome por causa da ajuda de conhecidos e desconhecidos.
O desemprego, para ela, sempre foi uma constante na vida, já que, sem oportunidade de estudar, nunca aprendeu a ler. Analfabeta em uma época em que, cada dia mais, a leitura se torna material central da força de trabalho de muitos empregos, fica ainda mais difícil entrar no mercado.

"Em março, as coisas já estavam difíceis, aí fui na lotérica passar meu cartão e pegar o dinheiro do Bolsa Família. Quando cheguei, só saiu a parcela do 13º, porque a menina do caixa disse que estava bloqueado. Perguntei o porquê e ela disse que o papel dela era apenas me dar o dinheiro, e que estava bloqueado, sem justificativa", disse Rosângela.

Sem saber ler, a mulher sequer conseguia entender o que dizia a máquina em que o cartão foi inserido. Também por causa disso, ela não soube procurar ajuda pela internet ou em canais digitais de atendimento. Por telefone, para ela, também fica difícil repassar os dados dos documentos. E em meio à pandemia, o mais impossível era sair de casa para tentar obter informações de forma presencial.

"Eu recebo R$ 380 e, com esse valor, alimento meus cinco filhos. Sou mãe solteira, não tenho marido e esta é a minha única fonte de renda. Já há dois meses não recebo meu benefício e estou vivendo da ajuda das pessoas", afirmou.
Desesperada, Rosângela recorreu às ruas para tentar alimentar os filhos. Ela se juntou a uma multidão de pedintes que, reunidos no Centro do Recife, esperam a boa vontade de projetos sociais que distribuem comida para os mais pobres. Sopas, cuscuz, sucos. Qualquer alimento que não vem do lixo é um banquete para quem não tem nada.

"Nesse negócio do coronavírus, tudo o que já era difícil, piorou. Principalmente para quem é mãe solteira como eu, que tenho cinco filhos. É engraçado que, no meio dessa crise, nada funciona, mas para o governo bloquear o benefício da gente, tudo funciona. O governo fala tanto que a gente não deve sair de casa, para evitar ser contaminado, mas como a gente vai se virar? Para vocês é fácil, porque o que procurar tem na dispensa para se alimentar. E a gente, na comunidade, humilde?", disse.
Rosângela deixou de ir às ruas quando recebeu, da associação Amigos da Vila do Papelão (Avipa), um vale de R$ 53, para comprar comida em um mercadinho da comunidade. A entidade, que antes da pandemia atuava com projetos educacionais, fez uma espécie de "fiado do bem" para ajudar as famílias cujos filhos participavam das ações, como é o caso de Rosângela.

A ação que matou a fome de Rosângela e seus cinco filhos foi organizada por moradores do Coque, comunidade em que ela vive e que é uma das primeiras localizações que vem à mente dos pernambucanos quando se fala das favelas da capital do estado.

Para a mulher, a ação chegou em boa hora, em todos os sentidos. Isso porque, mesmo sem ter estudado, todos os filhos dela sabem ler e frequentam a escola. A única exceção é o mais velho, de 17 anos, que desistiu de estudar no oitavo ano do ensino fundamental. Para a dona de casa, manter a educação dos filhos é ainda mais difícil em meio a uma pandemia.
"Não é porque você não tem estudo que vai abrir mão disso para seus filhos. Não é porque eu moro numa comunidade carente que preciso pensar pequeno. Eu quero o melhor para eles e tenho as maiores e melhores expectativas possíveis de que eles tenham uma vida diferente da minha. Eu não estudei por causa da minha mãe e quero que eles sejam diferentes", afirmou Rosângela.

O G1 questionou o Ministério da Cidadania sobre o porquê do corte do Bolsa Família de Rosângela, mas, até a última atualização desta reportagem, não obteve resposta.
O Coque
Frequentemente nos noticiários por causa da pobreza, violência e problemas de infraestrutura, o Coque — que tem o pior Índice de Desenvolvimento Humano da cidade.

População: 12.629 pessoas.
Localização: Na Ilha Joana Bezerra, às margens do Rio Capibaribe, na região central do Recife.
Origem: A ocupação começou no início do século 20. O nome da comunidade se deve aos primeiros habitantes do local, que viviam da extração do carvão mineral, conhecido como coque.


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