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VIOLÊNCIA: MPPE recebe denúncias de violência policial em reintegração no Recife

18.6.14

/ por casinhas agreste

Manifestantes pediram providências após ação da PM no Cais José Estelita.
Central de Inquérito do órgão vai analisar se houve conduta criminosa.
Do G1 PE


Promotores Marco Aurélio Farias e Charles Lima receberam queixas de manifestantes (Foto: Luna Markman / G1)

Pelo menos catorze manifestantes procuraram o Ministério Público de Pernambuco (MPPE), no Centro Recife, nesta terça (17), para pedir providências ao órgão sobre a violência sofrida durante a reintegração de posse realizada pela PM do terreno do Cais José Estelita, bairro de São José, área central da cidade. Todos foram encaminhados ao Instituto de Medicina Legal (IML) para passar por perícia traumatológica, medida que preservaria a prova de um possível delito cometido pelos policiais durante a ação, na manhã desta terça.

Três pessoas, entre elas dois homens e uma mulher, foram ao MPPE ainda pela manhã e registraram denúncias durante o expediente normal do órgão. "Eu vi que eles tinham escoriações e hematomas no corpo. Disseram que os ferimentos foram provocados durante e reintegração. Eles estavam acampados e, no relato deles, a PM não teria dialogado e já foi colocando para fora", disse o promotor Marco Aurélio Farias da Silva.
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Outros dois rapazes procuraram a MPPE por volta das 16h, e o fato já foi registrado no plantão ordinário. "Eles contaram que estavam do lado de fora do terreno, no início da tarde, quando teve um incidente com o [Batalhão de] Choque, que teria agido para dispersar uma reunião que eles estavam fazendo na rua. Em um deles, eu cheguei a ver três ou quatro marcas de ferimento, possivelmente, feitas por bala de borracha", explicou o promotor Charles Lima.

Um dos manifestantes contou que um grupo de 8 a 10 pessoas foi agredido durante a ação da PM. "A gente estava na altura do Clube Líbano [no Pina], e a polícia chegou pela rua de trás, perto do Bargaço. Começaram a atirar, com balas de borracha, e a usar bombas de gás. Tentamos entrar no restaurante, mas o segurança não permitiu. Vimos que mais à frente tem o acesso de funcionários e uma funcionária deixou aberto, todo mundo entrou. Não era no salão, mas uma área reservada, como um dormitório. Aí vem o segurança do Bargaço, o mesmo que tinha barrado a gente antes, trazendo a polícia e dizendo: 'não é funcionário, não'. Eles [os policiais] fizeram um corredor polonês e começaram a bater em todo mundo até a gente sair de lá. Tapa na cara, cassetete nas costas, murro na cabeça", relatou Rodrigo Coutinho. Por telefone, a gerência do Bargaço negou ao G1 ter ocorrido tumulto nas dependências do estabelecimento.



A psicóloga Carmem Régis contou que foi atingida por tiro de borracha na barriga enquanto protegia os filhos e o genro (Foto: Carmem Régis / Acervo Pessoal)
A psicóloga Carmem Régis contou que foi atingida por tiro
de borracha na barriga enquanto protegia os filhos e o
genro (Foto: Carmem Régis / Acervo Pessoal)
A psicóloga Carmem Régis, 48 anos, procurou o MPPE para denunciar agressões sofridas por PMs, na tarde desta terça. Ela contou que levou um tiro de borracha na barriga enquanto protegia os dois filhos e o genro durante confusão no Cais José Estelita. "A gente estava na calçada, fora do terreno. Alguns manifestantes estavam fechando o trânsito em intervalos, quando um motorista jogou o carro para cima deles, então o Choque se aproveitou disso para dispersar o movimento, atirando. Meus filhos e meu genro não se feriaram porque eu estava cobrindo eles. Uma bala me acertou porque virei para ver como estava a situação. Eu vim aqui reclamar do abuso da PM diante de pessoas indefesas, desarmadas e apavoradas", contou.
De acordo com relato de manifestantes, após a reintegração de posse, houve pelo menos mais três momentos em que o Batalhão de Choque da PM usou balas de borracha, spray de pimenta, bombas de efeito moral e gás lacrimogênio para dispersar o ato. O primeiro teria ocorrido durante um abraço simbólico no Cais José Estelita, quando uma menina parou o carro na via para aderir ao movimento e foi detida. O segundo ocorreu quando PMs chegaram para dispersar uma plenária realizada por um grupo nas proximidades de uma pracinha na Cabanga. O terceiro foi logo em seguida, quando os manifestantes afirmam que o Choque usou uma tática de acurralar as pessoas embaixo do viaduto, sem possibilidade de escapar.
Estudante Luan Melo mostra ferimentos na perna, provocados por balas de borracha (Foto: Luna Markman / G1)
Estudante Luan Melo mostra ferimentos na perna, provocados por balas de borracha (Foto: Luna Markman / G1)
O estudante Luan Melo, 23 anos, foi ferido na perna com uma bala de borracha, após a prisão da motorista. "Nós fomos encurralados pelo Choque. Tinha militares dos dois lados, não tivemos como fugir. A bala passou pela minha calça e ainda me feriu", disse.

O integrante do grupo Direitos Urbanos, Leonardo Cisneiros, narrou outro encurralamento na Ponte do Pina, próximo ao Cais José Estelita, já no final da tarde. "A gente tinha saído do Estelita, estávamos sentados no chão, juntou umas 20 pessoas, quando o Choque veio pela [Avenida] Herculano Bandeira. Tentei entrar em um restaurante, o segurança ainda apontou a arma para mim e chamou os policias. Um deles me reconheceu, porque estive na reintegração, e só por isso levei porradas de cassetete nas costas", contou.
Integrante do grupo Direitos Urbanos, Leonardo Cisneiros, narrou que foi 'encurralado' pelos PMs, que desferiram golpes com cassetetes nas suas costas (Foto: Luna Markman / G1)
Integrante do grupo Direitos Urbanos, Leonardo Cisneiros, narrou que foi 'encurralado' pelos PMs, que desferiram golpes com cassetetes nas suas costas (Foto: Luna Markman / G1)
A professora universitária Carolina Figueiredo levou ao MPPE um saco com vários artefatos recolhidos no chão, entre eles lacres de bombas e cartuchos vazios. "Foi usada uma força superior à quantidade de pessoas e ao tipo de manifestação. Além disso, o Choque, em mais de uma ocasião, usou a estratégia de encurralar manifestantes embaixo do viaduto, com dois batalhões em cada lado, e não tinha para onde as pessoas fugirem", apontou.
De acordo com o capitão Júlio Aragão, da Polícia Militar, duas pessoas foram detidas por causa das manifestações desta tarde. Um homem estaria portando um coquetel molotov e a mulher foi detida após parar seu carro na Avenida Engenheiro José Estelita e se recusar a tirar o veículo do local. Segundo a corporação, a motorista desobedeceu ordens diretas dos policiais e, por isso, foi detida. Os dois foram encaminhados à Central de Flagrantes, na área central do Recife.

Violações de direitos
O plantão ordinário do MPPE toma medidas de urgência em matérias criminais, direitos coletivos e outros assuntos. No caso das pessoas que estão procurando o órgão para denunciar ter sofrido violência durante a reintegração, o plantão encaminha as vítimas para o IML e depois leva a "notícia de fato" para a Central de Inquérito do MPPE, que irá analisar se o cidadão foi vítima ou não de conduta criminosa. Se o caso for comprovado, o Ministério Público oferece denúncia à Justiça estadual.
Artefatos como lacres de bombas e cartuchos vazios, usados pela PM, foram recolhidos e levados ao MPPE (Foto: Luna Markman / G1)
Artefatos como lacres de bombas e cartuchos vazios, usados pela PM, foram recolhidos e levados ao MPPE (Foto: Luna Markman / G1)

Em nota divulgada nesta terça, o Ministério Público estadual informa que a reintegração foi feita sem aviso prévio ao órgão, conforme acordado em reunião realizada em 23 de maio, com a presença da PM, Prefeitura do Recife, representantes do Projeto Novo Recife, Movimento Direitos Urbanos e sociedade civil. “Apesar do compromisso, ocorreu a desocupação violenta do local, mediante a utilização de força policial, desconsiderando o diálogo entre as diversas partes, com a perspectiva iminente de celebração de um acordo para desocupação e redesenho do Projeto Novo Recife, evitando danos aos cidadãos, às instituições, à liberdade de expressão e ao Estado democrático de Direito”, informa o comunicado.

O MPPE ressaltou que “está atento a violações de direito eventualmente ocorridas e adotará as providências legais dentro de sua competência institucional de defesa da liberdade de expressão, da ordem jurídica e do Estado democrático de Direito”.
Após a reintegração, o acampamento que ocorria dentro do terreno do José Estelita foi transferido para debaixo de uma das alças do Viaduto Capitão Temudo. Há pelo menos 15 barracas e uma cozinha no local. Pessoas também estão conversando do lado de fora. Na noite desta terça, a reportagem constatou que só havia uma viatura da PM na praça que fica em frente ao elevado.
Há pelo menos 15 barracas e uma cozinha no local no novo acampamento no José Estelita (Foto: Luna Markman / G1)
Há pelo menos 15 barracas e uma cozinha no local no novo acampamento no José Estelita (Foto: Luna Markman / G1)
Após reintegração, acampamento foi transferido para debaixo de uma das alças do Capitão Temudo (Foto: Luna Markman / G1)
Após reintegração, acampamento foi transferido para debaixo de uma das alças do Capitão Temudo (Foto: Luna Markman / G1)
Abraço no Cais José Estelita (Foto: Alexandre Figueirôa/Acervo Pessoal)
Grupo afirma ter apanhado da PM após dar abraço simbólico no Cais José Estelita (Foto: Alexandre Figueirôa/Acervo Pessoal)


Manifestante é agredido durante reintegração de posse no Cais José Estelita (Foto: Katherine Coutinho/G1 PE)
Manifestante mostra ferimentos no corpo  após ação da PM em reintegração de posse no Cais José Estelita (Foto: Katherine Coutinho/G1 PE)


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